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Estudo sobre travestis no trabalho sexual é o mais acessado do Periódicos UFRN

Portal da UFRN

Mariana Melo e Paiva RebouçasSala de Ciência-Agecom/UFRN 


Onde a sobrevivência se mistura ao desejo de pertencimento, travestis brasileiras constroem suas identidades à margem da sociedade. A pesquisa Travestis brasileiras trabalhadoras do sexo: algumas notas além da heteronormatividade, da antropóloga Julieta Vartabedian, investigou essa realidade a partir de um trabalho de campo realizado no Rio de Janeiro e em Barcelona entre 2008 e 2011. Publicado em 2017 na revista Bagoas – Estudos Gays: Gêneros e Sexualidades, do Instituto Humanitas (IH), o estudo se tornou o mais acessado do Portal de Periódicos da UFRN, ultrapassando 111 mil visualizações em 2024.


O estudo revela que, para muitas travestis, a prostituição não se limita a uma atividade econômica, mas funciona como um espaço de reconhecimento social e afirmação identitária. A feminização dos corpos, frequentemente obtida por meio de hormônios, cirurgias plásticas e injeções de silicone, não apenas aumenta as chances de trabalho no mercado do sexo, mas também reforça a sensação de pertencimento e status dentro da comunidade trans. No entanto, essa busca por aceitação ocorre em um contexto de extrema vulnerabilidade.


A prostituição oferece um espaço onde as travestis podem afirmar suas identidades e construir redes de apoio, mas também as expõe a riscos diários de violência. Segundo o projeto Transgender Europe, entre 2008 e 2016, foram registrados 938 homicídios de pessoas trans no Brasil, o maior número do mundo no período. A falta de oportunidades no mercado formal reforça essa dependência do trabalho sexual como única alternativa de sustento.


Outro fator crítico identificado na pesquisa é o impacto do envelhecimento na vida das travestis. Se quando jovens o trabalho sexual permite a obtenção de renda e reconhecimento social, a idade transforma essa realidade. A pesquisa destaca que, ao perderem parte da atratividade associada à juventude, muitas enfrentam ainda mais dificuldades de inserção social. Algumas tentam migrar para outras atividades, como cabeleireiras ou artistas, mas para a maioria a velhice significa um aumento do estigma e da precarização. Em muitos casos, o envelhecimento leva à solidão e à miséria, especialmente para aquelas que não conseguiram acumular recursos financeiros durante a juventude.


Para compreender essas dinâmicas, Vartabedian utilizou uma abordagem etnográfica multi-situada, combinando observação participante e entrevistas aprofundadas com travestis trabalhadoras do sexo, cirurgiões plásticos e agentes de ONGs atuantes na cena trans. A pesquisa adotou ainda uma perspectiva interseccional, analisando como fatores como classe social, raça e sexualidade moldam as trajetórias dessas mulheres e influenciam sua relação com o trabalho sexual.


O impacto do estudo reforça a necessidade de políticas públicas que garantam segurança, inclusão social e oportunidades de trabalho para travestis. Sem alternativas concretas de inserção econômica, a marginalização se perpetua e torna o envelhecimento ainda mais excludente. O grande número de acessos ao artigo mostra o interesse crescente de pesquisadores e da sociedade pelos desafios que essa população enfrenta no Brasil.